quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Incluindo os clássicos na Literatura Infantil

Esta foi uma comunicação que fiz na faculdade e agora partilho com vocês, não consegui colocar aqui dentro das normas da ABNT, tentei mas ao colocar no blog desconfigura.

INCLUINDO OS CLÁSSICOS NA LITERATURA INFANTIL
RESUMO

Apresento nesta comunicação resultados de pesquisa bibliográfica que tem como objetivo incentivar pais e professores a oferecerem leitura de clássicos de nossa literatura a seus pequenos filhos e/ou alunos. Ler esse tipo de texto para as crianças pode parecer estranho à primeira vista, mas é essa a proposta de Ana Maria Machado contida em seu livro Como e Por que ler os clássicos universais desde cedo (2007). O seu livro é uma fascinante viagem que se inicia entre gregos e troianos, passando pela Sagrada Escritura, pelas lendas do Rei Artur, pelas descobertas de ilhas e mundos, pelos encantos das fadas e enfim pelas histórias marítimas e aventuras sem fim, tão bem escritas e que nos fazem viver tão boas e exóticas experiências. Machado também argumenta que se familiarizarmos nossos pequenos com os clássicos desde cedo, além do prazer da leitura, eles estarão recebendo aos poucos, sem pressa, uma enorme riqueza cultural que para se aprender depois de grande, seria tarefa pesada e sem graça. A nossa linguagem está cheia de referências que necessitam de um conhecimento prévio para ser totalmente compreendida e contextualizada. Assim, quando dizemos que uma coisa é "bacana" ou falamos do "calcanhar de Aquiles", do "sonho de Ícaro" ou ainda de "separar o joio do trigo", "lavar as mãos" ou até mesmo fazermos uma "mesa redonda", estaremos nos referindo a algum deus, algum mito, parábola ou fato bíblico que só quem conhece os clássicos compreenderá. Negar isso às futuras gerações seria no mínimo um grande desperdício cultural.

Palavras-chave: clássicos infantis; literatura infantil; leitura.
INTRODUÇÃO

Esta comunicação é resultado de pesquisa bibliográfica e que tem como objetivo incentivar pais e principalmente professores, a oferecerem leitura de clássicos de nossa literatura a seus pequenos filhos e/ou alunos.
Os alunos dos anos iniciais do Ensino Fundamental, muitas vezes vêm de lares em que não existe o hábito de leitura. Às vezes é a figura do professor seu único modelo de leitor e por esse motivo o educador tem uma grande missão em suas mãos.
Ana Maria Machado é a autora do livro intitulado Como e por que ler os clássicos universais desde cedo (2002). Nesse livro ela defende o direito das crianças terem o primeiro contato com os grandes clássicos, desde pequenas.
É claro que não se espera que tenhamos crianças lendo extensos textos em sua forma original, mas ao menos proporcionar-lhes o contato com essas histórias através das adaptações feitas especialmente para elas e incentivadas a mais tarde, quando tiverem mais idade e o domínio completo da leitura, lerem também os originais.
Como ninguém deve ser obrigado a ler nada, pois ler não é dever e sim direito, é papel do professor despertar o desejo, criar as oportunidades para o gosto de se ler.
Alguém pode questionar o por que de se fazer uso de clássicos e não apenas dos conhecidos contos de fadas ou livros infantis. Os clássicos são livros eternos que não saem de “moda” e abrangem uma infinidade de paisagens, histórias e personagens que fazem parte da nossa vivência cultural. São viagens entre gregos e troianos, sagradas escrituras, lendas do Rei Artur, descobertas de ilhas e mundos, encantos das fadas, histórias marítimas e aventuras sem fim.

A IMPORTÂNCIA DE SE INCLUÍREM OS CLÁSSICOS NA LITERATURA INFANTIL

A nossa linguagem está cheia de referências que necessitam de um conhecimento prévio para ser totalmente compreendida e contextualizada, como registra Ana Maria Machado:
Quando dizemos que uma coisa é bacana, estamos fazendo alusão a Baco, o nome do romano deus do vinho. Se alguém recebe um presente de grego, isso é uma lembrança da guerra de Tróia. Se lança o pomo da discórdia, também é. Cada referência remonta a toda uma história. Falamos em ouvir o canto da sereia, em narcisismo, em complexo de Édipo, em caixa de Pandora, em calcanhar de Aquiles – e cada uma dessas expressões se refere a uma história grega diferente. (MACHADO, 2002, p.29)

Podemos lembrar também que as referências continuam nos nomes dos planetas: Júpiter, deus dos deuses; Marte, deus da guerra; Mercúrio, mensageiro dos deuses; Vênus, deusa do amor e da beleza; Saturno, pai de Júpiter e deus da agricultura; Urano, deus do céu e das estrelas; Netuno, deus do mar e Plutão, deus do inferno. Os meses do ano também apresentam essa influência, como por exemplo, Janeiro, que é referência ao deus Jano, considerado pelos romanos o “deus dos princípios”, o que “abria o ano”, o “porteiro do céu”. Se pesquisarmos a fundo, veremos que são infinitas as referências e que conhecer a mitologia greco-romana é fascinante.
Monteiro Lobato foi um gênio em adaptar a mitologia grega para as crianças em livros como Reinações de Narizinho, O picapau amarelo, O minotauro e Os doze trabalhos de Hércules. Ruth Rocha apresentou também um ótimo resumo de obras como Odisséia, e, há também outras adaptações como Presente de grego de Elenice Machado e Peripécias de Pilar de Flávia Lins e Silva.
Os clássicos, entretanto não se resumem à mitologia grega, há muito mais. A Sagrada Escritura proporciona também histórias lindíssimas, que independente de qual seja a crença religiosa do professor ou do aluno, é interessante conhecer, seja com uma visão religiosa ou crítica, mas que não podemos deixar de lado. A Bíblia apresenta narrativas variadas e para todos os gostos. Há a Arca de Noé, o nascimento de Moisés e sua vida no Egito, a passagem do mar Vermelho, a luta de David com o gigante Golias, o nascimento de Jesus e seus milagres e tantas outras histórias que enriquecem a cultura geral.
Também na linguagem, se nosso pequeno aluno conhecer esses relatos, entenderá:
[...] o que são tempos de vacas magras, e em que consiste vender a primogenitura por um prato de lentilhas. Ao transportar um bebê num moisés, saberá por que o cestinho tem esse nome. Quando encontrar expressões como “separar o joio do trigo”, “lavar as mãos”, “mudar da água para o vinho” ou “dar a outra face”, ou quando por acaso ler num jornal uma referência ao farisaísmo ou a sepulcros caiados, saberá exatamente a que o texto está fazendo alusão. (MACHADO, 2002, p.39)

Também fazem parte dos grandes clássicos universais, os torneios, o rei Artur e sua espada Excalibur, a corte em Camelot, a magia de Merlim, as bruxas, as princesas, os reis, os mercados populares, os gigantes, as proezas dos cavaleiros do universo medieval,
As histórias de cavalarias deram origem a uma das obras-primas da literatura universal, um dos clássicos que foram mais fundo na análise do espírito humano, de forma emocionante e divertida ao mesmo tempo – Dom Quixote de La Mancha. (MACHADO, 2002, p.53)

Esse mundo mágico continua atual em nossos dias como, por exemplo, na obra de J. R. Tolkien com o Hobbit e na trilogia de O senhor dos anéis. Hollywood fez inúmeras versões das lendas de cavaleiros e de Robin Hood, a magia de Merlin com suas corujas retornam no grande sucesso Harry Potter.
Também na linguagem se estivermos familiarizados com esse mundo, compreenderemos bem o que significa fazer uma “mesa redonda”, mesmo que estejamos diante de uma quadrada ou retangular.
Outros clássicos que nos levam a tempos e mundos diferentes como por exemplo As viagens de Gulliver do irlandês Jonathan Swift, causam sempre grande prazer para o leitor. Assim também como a coletânea das histórias orientais As mil e uma noites que trazem famosas histórias como Ali Babá e os quarenta ladrões, Aladim e a lâmpada maravilhosa e As aventuras de Simbad, o marujo, agradarão sem dúvida a criançada.
Só a título de ilustração, pois não se propõe aqui que nossos pequenos leiam 1984, o conhecido programa da TV Big Brother, vem do livro de George Orwel. O personagem Big Brother era o grande olho que tudo vê, o grande ouvido que tudo ouve. Outros livros, entretanto, seriam apreciados pelos pequenos, pois trazem navegações, descobertas de outras terras, sonhos, naufrágios e muitas aventuras, como é o caso de Robinson Crusoé.
Passando agora para os clássicos encantos que constituem os contos de fadas, temos que deixar claro que apesar de ser tão contada e recontada para nossas crianças não foram escritas originalmente para elas. Vejamos o que Machado escreve sobre isso:
Só para darmos um exemplo: conhecia-se uma versão de Cinderela no antigo Egito e, na mesma história, o motivo do pé pequenino que seria o único a caber num sapatinho de cristal, muito provavelmente, vem da antiga China, onde existia o costume de comprimir os pés femininos para não crescerem, como ideal de beleza. (MACHADO, 2002, p.69)

Charles Perrault, em 1697, recolheu e publicou alguns desses contos e em 1802 outra coletânea foi feita pelos irmãos Grimm e já modificadas e amenizadas como podemos perceber claramente em Chapeuzinho vermelho. Na versão de Perrault a personagem não tem chance alguma, ela não segue os conselhos da mãe e acaba morrendo devorada pelo lobo mau, já na versão dos Grimm, mesmo com a desobediência, ela é salva pelo caçador.
Na Dinamarca, algumas décadas depois, surge outra antologia de contos, mas que diferente de Perrault e dos Grimm, não é recolhida do povo e sim criada por Hans Christian Andersen. Entre suas histórias podemos citar O patinho feio, O soldadinho de chumbo, A nova roupa do Imperador e tantas outras.
Nas telas, Walt Disney também tornou conhecidos alguns contos de Andersen, apesar de ter modificar os originais, exemplo disso é A pequena sereia.
Sem dúvida os contos de fadas são clássicos a serem conhecidos desde cedo, pois sua linguagem poética é simbólica, suas histórias refletem anseios, medos, conflitos e sonhos de nossos pequenos leitores, e com a certeza de que mesmo passando pelos maiores apuros, tudo acabará bem, o mal será punido e os bons viverão felizes para sempre.

A CONTRIBUIÇÃO DO MÉTODO RECEPCIONAL NA FORMAÇÃO DE FUTUROS LEITORES

Levando em consideração todos os motivos acima mencionados e partindo das etapas do Método Recepcional e dos estudos realizados pelo Grupo de Pesquisa Literatura e Ensino, da Universidade Estadual do Norte Pioneiro (UENP), Campus da Faculdade Estadual de Filosofia, Ciências e Letras de Jacarezinho, sob a liderança da professora Hiudéia Tempesta Rodrigues Boberg, foi elaborado um roteiro de atividade e aplicado em uma segunda série de zona rural.
O método recepcional foi sistematizado pelas pesquisadoras Maria da Glória Bordini e Vera Teixeira Aguiar no livro Literatura: a formação do leitor: alternativas metodológicas, e consta de cinco etapas que pretendem levar em consideração as necessidades e também as preferências dos alunos: determinação do horizonte de expectativas, atendimento do horizonte de expectativas, ruptura do horizonte de expectativas, questionamento do horizonte de expectativas e ampliação do horizonte de expectativas. O grupo de pesquisa citado propôs uma readaptação do método na etapa da “ruptura do horizonte de expectativas” incluindo a transversalidade nesse momento. Vejamos como ficou:
1ª Determinação do horizonte de expectativas – nesse momento é a sala que expõe o que eles já conhecem e gostam. Para determinar esse horizonte foi colocado, em painel, várias gravuras de personagens como Chapeuzinho vermelho, A pequena sereia, Dom Quixote, Gulliver, Robin Hood, Jesus, Noé e a sua arca, Romeu e Julieta, entre outros, e perguntado à classe se eles os conheciam. A grande maioria conhecia bem os personagens dos contos de fadas e alguns bíblicos, mas desconheciam totalmente Dom Quixote ou Gulliver.
2ª Atendimento do horizonte de expectativas – Os alunos puderam contar algumas daquelas histórias que conheciam e para as que não se lembravam bem, esteve à disposição livrinhos para serem lidos e escutados. Também puderam desenhar as histórias e pintar os personagens.
3ª Ruptura do horizonte de expectativas – O que caracteriza esta etapa é a novidade, foram retomados aqueles personagens que eles desconheciam e convidados a conhecerem as histórias das quais eles fazem parte. A recepção foi ótima e a leitura inicial foi Ali Babá e os quarenta ladrões na adaptação feita por Edson Rocha Braga. A leitura foi feita em capítulos como em novelas. No início a proposta era de se ler um capítulo por dia a cada início de aula, mas houve vezes em que os apelos para se fazer a leitura de mais um capítulo ao final da aula foram tão grandes que isso acabou acontecendo. A transversalidade acontecia através de perguntas direcionadas de acordo com a leitura feita, por exemplo, no capítulo em que o irmão de Ali Babá descobre que ele tem moedas de ouro escondidas e sente inveja – “Existe muita gente invejosa assim como Cassim? A inveja faz bem? Como deve ser o relacionamento entre irmãos? Como é esse relacionamento em sua casa?”
As palavras mágicas “Abre-te, sésamo!” foi outro ponto de partida que aproveitado para questionar se hoje em dia existem palavras mágicas. As crianças demoraram um pouco, mas descobriram que sim: “Por favor, obrigado e desculpe” - foram as eleitas, pois com palavrinhas simples como essas, podem ser evitadas grandes confusões.
Outro livro que lido nessa etapa foi Dom Quixote numa adaptação feita por Alexandre Barbosa de Souza, coleção Recontar, da Escala Educacional.
4ª Questionamento do horizonte de expectativas – Nesse momento deve acontecer uma comparação entre as etapas anteriores, ou seja, o aluno deve ser levado a refletir se ele conhece mais do que conhecia no início. É claro que uma classe dos primeiros anos do ensino fundamental não percebe estar passando por etapas de um método, mas puderam verificar que agora já eram capazes de identificar mais personagens daquele painel comentado no início e mesmo que alguns não consigam recontar as novas histórias, as conhecem.
5ª Ampliação do horizonte de expectativas – Como são pequenos alunos, muitos ainda sem dominar a escrita e a leitura convencionais, a proposta aqui foi continuar a série de clássicos como Gulliver, Teseu e o Minotauro, Os três mosqueteiros e Pinóquio em forma de quadrinhos de uma coleção já extinta da Editora Escala. Sempre deixando-se claro que há muito mais para se contar e descobrir e que eles mesmos devem buscar mais pra frente, conhecer a fundo essas grandes histórias.

CONCLUSÃO

Outras adaptações estão nas estantes de nossas bibliotecas escolares, à espera de serem apresentadas a nossos pequenos alunos. Com certeza serão bem vindas com todos seus encantamentos e aventuras e enriquecerão os sonhos e a cultura de nossos alunos, além de fazerem, a nós professores, retomar essas viagens maravilhosas, percebendo novos pontos antes não vistos, pois reler um clássico é navegar e as águas nunca são as mesmas, sempre se renovam.

REFERÊNCIAS


MACHADO, Ana Maria. Como e por que ler os clássicos universais desde cedo. Rio de Janeiro: Objetiva, 2002.



BIBLIOGRAFIA CONSULTADA


aGUIAR, Vera Teixeira de; BORDINI, Maria da Glória. Literatura: a formação do leitor. Porto Alegre: Global, 1993.

ALI BABÁ E OS QUARENTA LADRÕES. Adaptação de Edson Rocha Braga. São Paulo: Scipione, 2000. (Série Reencontro Infantil).

AS MAIS BELAS HISTÓRIAS INFANTIS. São Paulo: Escala, [19??]

CERVANTES, Miguel de. Dom Quixote. Adaptado por Alexandre B. de Souza. São Paulo: Escala Educacional, 2004.


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